Gustavo Glasser: empreendedor trans e cavaleiro nas horas vagas

Uma matéria especial no portal do Clube Hípico de Santo Amaro marca o início da temporada 2020 e os novos anos 20. O entrevistado é o sócio Gustavo Glasser, 35, um empresário trans, que em 2013 fundou a Carambola, com o objetivo de incluir minoriais mulheres, negros, pessoas com necessidades especiais e LGBTI+ – no mercado de TI. Seis anos mais tarde, em novembro de 2019, Gustavo graças ao bem sucedido negócio foi condecorado com o Prêmio Empreendedor Social promovido pela Folha de São Paulo em parceria com a fundação Fundação Schwab. O DNA da carambola, a recente transição de gênero e a relação com os cavalos levam uma mensagem de respeito ao individuo e mútuo em que todos saem ganhando. A trajetória não foi fácil, porém exemplar. Gustavo nasceu Juliana em uma família de classe média no Grajaú e há cerca de 15 anos se assumiu homossexual. Curiosamente, ao saber da opção da filha, seus pais saíram de casa. Passou por privações, trabalhou fazendo bicos como barman, fez trabalhos braçais carregando geladeiras e montagem de palcos. A certa altura, cansado de ganhar pouco, parou de trabalhar para – graças a indicação de um amigo que ganhava cinco mil reis – fazer um curso de programador gratuito no Senac. Sem renda devido ao início dos estudos, chegou a ficar três meses sem luz em casa. Mas logo Gustavo começou a colher os frutos de sua dedicação e habilidades: conseguiu um estágio no Centro de Inovação da Microsoft. Com bolsas da Prouni e Senac se formou em Bacharel em Sistemas de Informações. Depois veio o primeiro emprego em um banco. Em 2011, devido a uma doença autoimune ficou quase um ano sem trabalhar e, ao retornar ao trabalho, havia perdido a vaga. Foi quando decidiu montar seu próprio negócio a Carambola, que inicialmente era para ser somente uma fábrica de software e acabou se transformou em uma empresa de educação e desenvolvimento de TI sob encomenda. Após um período de experiências com altos e baixos, a Carambola ganhou um sócio: o engenheiro Renato de Almeida Prado. O modelo de negócio deu certo. Em 2017, Gustavo palestrava no Microsoft Inspire. “Comecei a Carambola em 2013 com uma perspectiva de tentar transformar o mercado de tecnologia: um mercado que tem muitas oportunidades, com mais de 300 mil vagas em aberto no Brasil, uma carência de profissionais enorme e falta de informação. E a gente entendeu que se aliássemos essa falta de profissionais com um processo de formação e educação conseguiríamos impactar positivamente a vida de muita gente. Então é o que fazemos hoje!”, conta Gustavo, empreendedor e cavaleiro nas horas vagas, que recém passou pela transição de gênero, em entrevista no Clube Hípico de Santo Amaro, onde é sócio há dois anos e atualmente mantém três cavalos. “Nosso foco é a formação de pessoas que são minorias em representatividade em mercado de tecnologia que hoje é formado em sua maioria por homens brancos heterossexuais de classe média alta, ou seja, mulheres, negros, lgbts+ estão fora desse mercado. Mesmo as empresas que trabalham com um processo de inclusão muito grande ainda têm números, por exemplo de equidade entre homens e mulheres, muito longe do que seria ideal. Então trabalhamos com a formação dessas pessoas que hoje por uma série de motivos têm dificuldade de acessar esse mercado, principalmente voltado para geração de renda na base de piramide,” explica Gustavo. “A Carambola hoje tem uma unidade em São Paulo, onde essas pessoas passam por um processo de seleção e participam de um programa de formação durante seis meses e depois são contratadas por empresas. Desde 2017 a gente atua com esse modelo de educação em que grandes empresas são nossos clientes para desenvolver projetos de TI, formar profissionais e preencher as vagas disponíveis. Nossa ideia é expandir nos próximos anos para várias regiões do Brasil e EUA, onde já estamos montando uma filial em São Francisco”, conta Gustavo. “Nossos principais clientes hoje são o Banco Itaú e grupo Fleury. Também passamos por um processo de aceleração da estação Hack com apoio do facebook e agora está assinando um contrato com a B2W Digital que é a americanas.com”, complementa o jovem empreendedor. Estabelecido profissionalmente, há cerca de anos Gustavo retomou o gosto pelo hipismo em 2017. “Eu montei quando era criança na Hípica Santa Fé até os nove anos. Depois quando a Santa Fé saiu da Robert Kennedy (Interlagos) eu parei. Agora eu faço as provas de 1/1.10 metro. Acho que treino menos que eu precisava. Mas eu gosto demais, os cavalos são encantadores”, conta Gustavo, aluno da amazona e treinadora Camila Ney Messias, a Camilinha. “Antes mesmo de vir para Santo Amaro eu comprei um cavalo. Achei ele bonito. Hoje tenho três cavalos, meu negócio está indo super bem.” E foi em 2019 que ocorreu a grande transformação na vida de Juliana, que já se vestia como homem. Desde adolescente eu me sinto atraído por mulheres e me sentia homem, sempre fui um homem, é um processo complexo. “Passei por um processo de transição de gênero. Comecei em julho de 2019 com processo de retificação do nome. Depois veio o início da hormonização para transição de gênero. Basicamente tomo testosterona para fazer um processo de transição para me tornar Gustavo, socialmente agora sou Gustavo. Também tirei os seios: eu sou homem”, garante Gustavo. “É um processo complexo. A gente não entende muito, porque não é algo que não está em nosso dia a dia. Aí em meados de 2019 decidi que era o que precisava fazer. Acho que estava pronto emocionalmente para encarar essa transição socialmente porque internamente já tava muito claro o que eu era: agora o meu exterior está refletindo o meu interior. Estou muito feliz!” Uma outra questão não poderia ficar de fora: a relação com os cavalos trouxe confiança para fazer a transição? “Acho que sim. Especialmente com um dos meus cavalos eu tenho uma relação muito forte. Eu acho que de certa forma eu me vi um pouco no